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De paradinha à bossa! Criatividade musical e respeito às tradições são os pilares da diferença entre baterias

Mesmo cumprindo um padrão de ritmo exigido, o processo de construção de uma bateria se diferencia pela influência histórica da agremiação. 'Preservar o ritmo da escola, ainda mais nós que somos oriundos, é mais que obrigação', afirma Macaco Branco

Segundo muitos especialistas, a definição rápida de bateria é “Coração de uma escola de samba”, e, mesmo sendo a principal responsável pelo lado musical, ela pulsa através de maneiras diferentes de acordo com a agremiação. Quanto mais apaixonado e interessado pelo universo das baterias, notará que cada agremiação tem uma forma singular em que esse coração bate. Mais rápido ou mais devagar, mais forte ou menos intenso. O fato é que, mesmo seguindo um padrão de ritmo exigido, o processo de construção se diferencia.

O artigo discorre sobre a criatividade musical, mas já chegaremos lá. Antes, volto pra 1959, ano em que o Mestre André, um dos maiores sambistas que já existiu, tropeça durante o desfile da Mocidade Independente de Padre Migue e toda bateria para. Ele se levanta, rodopia e aponta para que o repique retome o samba. Aos gritos delirantes da arquibancada, Mestre André ali acaba de inventar a “paradinha”. No começo uma espécie de resposta geral da bateria para as frases do repique, hoje se tornou variações que aproveitam todos os instrumentos, das mais diferentes formas possíveis.

O próprio julgamento estimula as variantes de ritmos. No começo, era exigido na cabeça do refrão com a retomada na primeira estrofe, atualmente é livre. Isso desperta um debate polêmico, afinal, qual é a real função de uma bateria? Dito isso, naturalmente formam-se dois grupos: os que utilizam como argumento que “a função da bateria é de sustentar o canto da escola” com os que defendem a “liberdade, ousadia, variação e estímulo para empolgação do sambista”.

Inegavelmente o assunto pode servir para uma nova coluna, mas o fato é que a forma de construir uma paradinha pode dizer muito sobre a bateria. Para facilitar o entendimento, levantei alguns pontos principais na hora de definir uma linha de trabalho. Primeiro, “o que o enredo pede?”. Um tema alegre, pressiona a bateria para bossas vibrantes e explosivas. Um desfile dramático e reflexivo, uma postura de mais valorização das linhas melódicas, e assim sucessivamente. Segundo “qual o nível técnico?”, isso vai definir o caminho após o esboço inicial, ou simplifica ou insere mais elementos. Terceiro é “como a subjetividade vai influenciar o trabalho?”. Independente da classificação, a busca pela nota máxima passa pela interpretação do mestre. Isso faz com que a bateria apresente uma extensa variedade de bossas com coreografias, e outras se concentrem em apenas duas paradinhas com variantes que garantem uma avaliação positiva por parte dos julgadores.

Mestre André no comando da bateria da Mocidade Independente. Foto: O Dia

Até mesmo com todas as informações acima, a bateria ainda demonstra traços fortes de identidade. Por exemplo, as quebras de ritmos da bateria e ataques do naipe de caixa, com a divisão entre o tarol, feita nas bossas do Salgueiro. Assim como no caso da Mocidade Independente que aproveita a informação da batida de caixa das duas baquetas pra acrescentar informações no momento do breque, alinhando com frases dos surdos de marcação. Dentro de uma única bossa existem elementos que se autoexplicam, ao mesmo tempo que comunicam parte de sua história.

Além dos vários exemplos, a bateria da Mangueira também defende bem a característica citada. A permanência da batida de caixa, a forma de tocar os tamborins e o reconhecível andamento com apenas o surdo de primeira, demonstra o respeito com a história da escola.

Mas não se limita ao andamento, nas paradinhas a bateria aproveita bastante os timbres do timbal e a retomada de dois compassos apenas com surdos. O próprio Mestre Wesley, logo quando assumiu o cargo há três anos, optou por uma postura de lapidação com os ritmistas em prol da forma em que a bateria se apresenta.

Esse é um dos poucos exemplos que estão presentes no trabalho de uma bateria de escola de samba. Prova de que é possível fornecer um material musical moderno, respeitando as origens da escola.

O músico e mestre de bateria da Vila Isabel, o Macaco Branco, é nascido na escola e apresenta um trabalho de alta qualidade, aliado com a tradição da escola de samba.

“É muito importante que eu preserve a tradição e o ritmo tradicional de onde eu nasci, e fui criado. Eu falo da Vila porque é a escola que eu trabalho, mas acho isso para todas as escolas. Cada bateria tem a sua característica! Imagina se todas tocassem de forma igual? Qual seria o critério? O jurado precisa julgar em cima das características da Vila Isabel, da Mangueira a mesma coisa. Eu creio que preservar o ritmo da escola, ainda mais nós que somos oriundos, é mais que obrigação”, afirmou Macaco Branco.

Afinal, o mérito da criatividade musical em evolução no carnaval pode ser atribuído para diferentes destinos. Desde os sambistas mais antigos até os da nova geração. Desde o jovem da escolinha até o diretor de bateria. Porém, a vivência histórica coletiva de uma agremiação seja a explicação mais justa ao espetáculo musical diverso entre as baterias, que ao mesmo tempo é similar no seu ponto de partida ideológico.

O destino é o mesmo, mas o caminho é puramente individual.

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