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Entrevistão com Gilmar, mestre de bateria do Império Serrano: ‘É o ano mais desafiador pra mim’

Por Thaise Lima

Com um desafio enorme nas mãos, mestre Gilmar da tradicional Sinfônica recebeu a reportagem do CARNAVALESCO para a série ‘Entrevistão’ e está convicto de que mesmo com todas as críticas do público, o Império Serrano vai brilhar a avenida e desconstruir toda essa má impressão de colocar uma música de MPB na Marquês de Sapucaí como um samba-enredo.

Qual é o tamanho do seu desafio em acompanhar o samba de 2019?

“Na minha carreira como mestre de bateria é o divisor de águas. Uma coisa é você tocar numa festa de 15 anos, qualquer tipo de animação em festa, em eventos e você fazer 5, 10 passadas, uma outra coisa é você levar esse tipo de samba para a avenida e conseguir sustentar esse samba no andamento em que a grande comunidade e todos que estão ali podem cantar. Isso é muito desafiador, até para a gente achar um ponto de equilíbrio um andamento confortável. Eu posso dizer na minha carreira é o ano mais desafiador pra mim, mas está sendo o ano mais prazeroso. Está sendo um ano diferente de todos esses anos que eu já trabalhei como mestra de bateria”.

Quando soube pela primeira vez que levaria a música do Gonzaguinha para Avenida o que sentiu e pensou?

ASSUSTADOR! Lembro que foi numa segunda-feira e me falaram pra dar um pulinho no barracão que iria ter uma reunião. O carnavalesco sentou junto com o diretor e a presidente e falaram assim: ‘Gilmar, estamos com uma ideia inovadora, queremos revolucionar o carnaval, o Império sempre trouxe coisas diferentes para o carnaval e ano a gente quer fazer uma coisa diferente, queremos colocar essa música para o carnaval de 2019’. Eu disse que achei legal, e perguntei se aquele seria o enredo e e eles me falaram ‘Não, Gilmar. Esse vai ser o samba-enredo’. Eu fiquei parado, olhei para o carnavalesco e em primeiro momento só falei as partes negativas, exemplo “como era ter o Império Serrano sem disputa de samba, como vai ser passado isso para os compositores? como vai ser passado para a comunidade? O Império é a escola que tem a ala de compositores que tem mais belos sambas da história do carnaval, como vai ser pegar uma música que não é samba-enredo, é uma MPB e transformar para samba-enredo? Inclusive, tem uma parte da música que a métrica é muito complicada para ser cantada, eles apostaram numa coisa que na arquibancada qualquer criancinha vai saber cantar, mas e a opinião pública? Eu
vim muito assustado pra casa, mas sou movido a desafios. Se der certo, a gente nunca fez isso. Fiquei pensando que poderia ser 8 como também podia ser 80. Depois começou a melhorar, fizemos a gravação, amigos meus que não aceitavam hoje vem no ensaio, apertam minha mão e dizem que eram contra isso. No início, 80% das reações foram negativas, mas hoje se você vê os imperianos que estão aqui comigo dizem que mudam totalmente a opinião sobre o que vocês estão fazendo, as pessoas ficam encantadas, acho que o público tinha medo de como iria ser cantado. Começamos o nosso ensaio em junho, e fomos acertar tudo no final do ano. Trabalhamos muito andamento para acharmos
uma média, hoje posso falar que achamos uma medida boa no tempo de desfile”.

O que fez na bateria para ajudar na condução do samba?

Primeiramente foi o andamento. Temos uma famosa virada de três em toda passada de samba e quem entende de bateria sabe, que só o Império faz isso, pra esse ano vimos que não iria encaixar muito bem toda essa passada. Não colocamos para ajudar no bom andamento, achamos que isso poderia atrapalhar e também não ia encaixar com o canto, e as nossas bossas. O Império se você colocar na história, sempre gostei de bossas muito descompassadas, torta, esse ano eu vi que se fizesse isso nesse tipo de música, eu iria me estrepar. Tive que sair do Gilmar, da minha referência, do que eu gosto de fazer. Eu peguei totalmente a melodia da música, porque eu poderia ser taxado de acabar com uma música popular. Os pontos primordiais foram a virada de três, o andamento e as minhas bossas, tive que rever muito as bossas que a gente gosta de trabalhar para esse tipo de música. Vamos usar bossas sim, mas não as que o mestre Gilmar está acostumado a usar”.

Você assumiu o comando pós Átila. Como foi o período?

“Eu nunca achei que o Átila fosse sair do Império. Pra mim, ele seria eterno no Império, por isso nunca almejei me tornar mestre de bateria do Império. Quando eu assumi a bateria em termos de ritmo, não tive problema nenhum, vi que o Átila já me preparava para isso há muito tempo. Eu assumi o lugar de um ícone. Átila não é meu cunhado, ele é meu irmão. Eu não considero que eu alcancei nada que o Átila alcançou, não por reconhecimento e mérito não, é porque ele sempre foi um cara muito dedicado a bateria do Império. Eu só tive medo de mostrar para o mundo do samba que era o mestre Gilmar que estava assumindo a bateria da Sinfônica. Mas em 2010 foi 40 pontos com vários prêmios e reconhecimento. Aos poucos eu fui colocando algumas coisas minhas na bateria”.

É fácil ou difícil comandar uma bateria tão tradicional como é a do Império? 

“Em relação ao carnaval de 2019 foi muito difícil. Com receio de como seria a performance da bateria na avenida. É complicado pensar como vou ser julgado. Se você me perguntar se eu tenho medo, eu digo que tenho medo por se tratar de um clássico e uma escola tradicional que tem suas características”.

Você acha que se fosse uma outra escola de samba que não tem essa tradição toda de bateria, acha que a aceitação seria mais fácil?

“Acho que sim, bem mais fácil, porque é uma escola tradicional. Por exemplo, se fosse a Grande Rio, é uma escola que gosta de fazer enredos irreverentes, aquelas músicas alegres, acho que até cairia bem para eles. Mas, a bateria do Império tocar isso, tradicional do Rio de Janeiro é bem complicado”.

Hoje muitas escolas usam agogôs do Império. O que representa isso para vocês?

“É uma questão de alegria saber que o Império Serrano, a minha escola levou para o mundo, não é só aqui no Rio, em São Paulo, a mídia de lá me liga para saber de agogô, dar aula, porque a referência é nossa. As vezes eu vou dar aula para pessoas de outros países por conta do agogô. É uma referência muito bacana, saber que um instrumento que foi criado dentro da escola de samba Império Serrano, mas que outras coirmãs e mestres de baterias acham legal e bom para a bateria deles. Mas essa aceitação já foi muito difícil, antes eu achava que estavam copiando o agogô do Império, hoje em dia não, tudo que é bom se copia. Hoje nós temos o agogô do Império”.

Mudaria algo no julgamento do quesito Bateria? 

“Eu mudaria o fato de que o jurado não pode ter um bate papo com quem vai ser
julgado. Por que quem julga não pode ouvir quem está sendo julgado? Por que eu não posso tirar uma dúvida com ele? Por que eu não posso sentar numa plenária e fazer perguntas técnicas para ele? Às vezes muitos argumentos deles não vem bem explicados, os jurados escrevem coisas pra gente e pronto acabou. Eu sou julgado e não posso conversar? Ano que vem ele vai me julgar da mesma forma e eu não posso tirar minhas dúvidas com eles. Acho que as baterias não devem ser julgadas de uma só maneira, eu tenho uma característica, a Mocidade tem outra, a Grande Rio tem a bateria dela, o Salgueiro, Mangueira, Portela . . . muita gente acha que a caixa que toca em cima é tudo igual. Negativo. Acho que tinha que ter um meio termo e conversar, tínhamos que
ouvir e ser ouvidos”.

Ano passado o Império acabou rebaixado e foi salvo. Esse ano a escola sofre como todas. Como mudar essa realidade do Império?

Acho que foi uma grande injustiça colocar o Império como a primeira escola a desfilar. A escola que sobe não tem o mesmo recurso de quem está no Especial há anos. Não tem as mesmas parcerias. O Império Serrano não tem patrono, temos a presidente e a nossa administração. Pegam recursos, patrocínios, mas hoje até para você ter isso é complicado. É uma escola que o recurso é totalmente dela ou de parceiros, acho que tinham que olhar bem a mão como vai ser julgada, não quero clemência, negativo, só quero ser julgado igual uma escola que vai passar na segunda-feira sendo a quarta escola a desfilar”.

O que você pensa que precisa ser feito para o imperiano voltar a acreditar na
escola no topo do ranking e chegar a décima conquista?

“Os imperianos deixarem a política de lado, porque eu sinto falta de muitos amigos
de verdade. Eu nunca participei de nenhuma política de quem vai ser o
presidente. A bateria do Império nunca se meteu, os ritmistas nunca se meteram e
nem tivemos esse negócio de fechar com o mestre tal, pra eleger o futuro presidente. Nunca quis, sempre fui neutro, se chegar um presidente e falar ‘fecha comigo se não você não vai ficar ’ eu vou dizer que tudo bem, se vai entrar e me tirar ok, graças a Deus até hoje nunca aconteceu isso comigo. Acho que a escola tem que se unir, não estou falando que o Império é uma escola desunida, eu digo se unir politicamente, temos pessoas muito inteligentes e influentes dentro da escola, se pegarmos essas influências juntas, ninguém seguraria o Império Serrano. Nunca pensei nisso, mas se hoje eu fosse candidato a presidente do Império, eu iria pegar todos esses amigos que estão longe e iria falar que aqui só precisamos de um presidente, podemos nos juntar e tocar o Império pra frente, eu iria unir mais quem entende de carnaval, fora isso, o Império Serrano tem tudo que uma escola precisa”.

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