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Jesus da Mangueira tem rosto negro, sangue de índio e corpo de mulher

Atual campeã do Carnaval Carioca, Mangueira traz em 2020 o enredo “A Verdade Vos Fará Livre”, falando sobre a figura de Jesus. Mas não é um desfile que simplesmente narra as passagens da Bíblia e o martírio de Cristo. A tradicional verde e rosa propôs uma indagação sobre como seria o retorno de Jesus nos dias atuais, em um contexto de intolerância, preconceito, violência e perseguição. O Jesus da Gente, “moleque pilintra do Buraco Quente (região do Morro da Mangueira)”, como diz a letra do samba, tem “rosto negro, sangue de índio e corpo de mulher” e está do lado do samba.

Para desenvolver esse enredo de inspiração religiosa, a Mangueira se transformou na Estação Primeira de Nazaré, unindo a região do Oriente Médio com o morro que dá nome a escola. A figura de Jesus foi representada em faces distintas, encontrando pontos de contato com minorias, em que as pessoas de comunidade passam a representar Cristo. Mayara Bonfim, desfilando pela terceira vez na ala de passistas da escola, estava orgulhosa em fazer parte desse desfile, porque se identificou com o enredo.

“Ta falando do preto, do pobre, do favelado, do gay… Eu tô muito feliz porque me representa como mulher negra nessa sociedade com tanto preconceito”. As passistas vieram de vermelho, branco e dourado, representando o ‘Poder de Roma’, onde Jesus é preso sob alegação de conspirar contra o Império Romano.

Mayara acredita que Cristo iria sofrer se voltasse hoje como morador de comunidade. “Sofreria muito preconceito por se juntar aos mais necessitados, aos mais pobres, com os gays, com os negros, os oprimidos… Acho que ele sofreria bastante, como a gente está sofrendo hoje em dia”.

Thiago Noronha, de 37 anos, fez sua estréia na Mangueira desfilando na ala dos ‘Fariseus’, que foram ameaçados pela mensagem difundida por Jesus, ao invés de se arrependerem, uniram-se para estimular a sua morte. Ele também crê que o Cristo não se daria muito bem se voltasse no Rio de Janeiro do tempos atuais.

“Jesus estaria bem encrencado com as pessoas que estão aqui governando o nosso país. Com as ideias dele, muito progressistas, acho que ele ia ser ‘enquadrado'”.

“Essas questões políticas tem que estar cada vez mais presentes no samba”, completou Thiago. Sua fantasia tinha predomínio das cores verde, dourado e amarelo, com algumas pedras vermelhas. Muitas penas compunham a parte da cabeça e o adereço de mão trazido pela ala, causando um efeito de luxo e requinte. Outra ala que caprichou nos detalhes do figurino era ‘O Cordão da Liberdade’, que trazia no estandarte de mão dos componentes um Jesus-POP, totalmente carnavalizado. Muitas cores faziam parte do visual da ala, que era a última da escola. Mara Lúcia, de 63 anos, uma das integrantes da ala ,desfilou pela quinta vez na Mangueira.

“Estou emocionada, achei tudo muito lindo”. Ela é mais uma mangueirense a concordar que Cristo não teria vida fácil ao voltar. “Se voltasse hoje Jesus ia ser muito perseguido. Ia ser igual mesmo ao que aconteceu na história que contam. Acho que muitos políticos não iriam gostar”.

A baiana Rosângela Rodrigues, de 66 anos, desfila há 14 carnavais pela Estação Primeira. Batizada de “A Intolerância é uma Cruz”, a ala representou o preconceito com as religiões, principalmente as manifestações de matrizes africanas. A fantasia, toda branca e dourada, trazia uma cruz vazada no costeiro. Búzios, laços, espelhos e o rosto coberto com fios brilhantes faziam referência a Oxum, orixá da beleza. Rosângela elogiou o figurino, que além de visualmente rico, segundo ela, era bem confortável para evoluir. Para ela, se Jesus voltasse hoje, “melhorava a população. O pessoal tá muito desumano”.

Nagib Jaime, de 64 anos, sendo 40 só de Mangueira, é integrante da velha guarda e segue a mesma linha de raciocínio da baiana Rosângela: “O amor é o caminho pra tudo”. A tradicionalíssima velha guarda mangueirense veio elegante, de terno e calça rosa, gravata e camisa verde e chapéu panamá. Eles simbolizavam As Cores de um Coração em Festa.

“Se todos soubessem que o amor é a base da vida não teria guerra. Todas as pessoas seriam unidas, umas com as outras, seria tudo maravilhoso”, desabafou Nagib.

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