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Leandro Vieira: ‘Meu carnaval inesquecível é o de 2019, sem a menor sombra de dúvida, ele quebrou a banca’

Nos últimos cincos carnavais do Grupo Especial do Rio de Janeiro, o carnavalesco Leandro Vieira conquistou dois títulos e ainda faturou um outro no Grupo de Acesso

Nos últimos cincos carnavais do Grupo Especial do Rio de Janeiro, o carnavalesco Leandro Vieira conquistou dois títulos e ainda faturou um outro no Grupo de Acesso. Abaixo, você pode ler a primeira parte da entrevista com o artista. Ela foi publicada neste sábado no jornal O Dia.

Quando você desenvolve um enredo como funciona esse processo?

“O enredo precisa estabelecer um diálogo prévio com a escola que represento. Não consigo pensar que não dialogue com a comunidade. Esse pensamento é muito particular. A maneira como penso esse diálogo, nem sempre a maioria acha que é possível. Muitas vezes as pessoas dizem que as coisas não tem nem relação com a Mangueira e pra mim faz muito sentido”.

Quando falam que você faz enredo para lacrar e fazer política como isso toca em você?

“Não toca. Isso é um equívoco de quem pensa assim. Não existe carnaval que não seja político. Toda escolha é política. Viver é político. Partido é outra discussão. Meus enredos nunca foram de partidos. Política é um pensamento. Você pode ser político, sem ser partidário. Meus enredos, emboram as pessoas fiquem tecendo pensamento sobre o que faço, refletem um pensamento. Partidário, jamais. Os desfiles das escolas de samba do Rio de Janeiro nos últimos anos têm sido políticos em todos os sentidos”.

Você sempre falou que quer ser um carnavalesco para fazer história na Mangueira e ficar um bom tempo. Já fez? Tem 100% de liberdade para trabalhar?

“Tenho 110% de liberdade. Isso me motiva a estar aqui. Vou para o sexto carnaval na Mangueira. Sempre tive total autonomia. Quem me oferecer 100% de liberdade, ainda vai estar devendo para Mangueira que me dá 110%. Ainda estou fazendo minha história. Trilhando o caminho que acho que é bom pra mim. Meu maior carnaval sempre será o próximo. Meu carnaval inesquecível é o de 2019, sem a menor sombra de dúvida, ele quebrou a banca, literalmente, em todos os sentidos que isso pode significar”.

Dizem que a Mangueira apelou para o nome da Marielle Franco no desfile de 2019 e que depois do samba campeão ela foi encaixada no enredo. Como isso aconteceu?

“Não foi encaixada. O compositor é um artista, como também sou artista, tenho entendimento que artista gosta de liberdade. O bom compositor é aquela que interpreta a sinopse sem fugir do pensamento central. É muito fácil entender que o enredo da Mangueira falava de lideranças apagadas. E a Marielle se aproxima da história da Carolina de Jesus e de outros tantos, pretos, favelados e que alcançaram notoriedade. Quem diz que a Marielle não fazia parte do enredo da Mangueira está sendo muito literal e meu trabalho não é literal”.

Como você analisa a arte no país e no carnaval?

“Os artistas estão produzindo obras que são o reflexo do tempo. A arte vai bem, porque existe uma série de pessoas aparecendo e traçando gritos e desejos do tempo em que a gente vive. Olhando para o carnaval, a produção intelectualmente e artística vai muito bem. Tem uma série de novos artistas que estão a pleno vapor. Acho que o carnaval não vinha há tempo tão bem como agora”.

Você construiu uma bandeira do Brasil em verde e rosa no desfile de 2019 e ela foi parar em exposição. Não gosta da oficial?

“Gosto da bandeira do Brasil. A bandeira que eu realizei ela pensa a bandeira do Brasil e os valores patrióticos. Ela em verde e rosa é uma bandeira possível nesse tempo que vivemos. Fico feliz que seja uma obra do carnaval que tenha alcançado outros lugares. Tenho uma crítica pessoal que o carnaval segue se defendendo como uma festa. Acho muito triste ver gente do carnaval falando apenas como festa, sem desdobrar todas possibilidades e demandas. O país, a sociedade, tem muita dificuldade de entender o carnaval como patrimônio artístico e cultural. Por uma série de questões, que passam pelo preconceito social e racial. Trabalho para fazer jus ao carnaval que o Brasil tem. É uma atividade que pode muito mais coisas do que ser apenas uma festa”.

Como estará o desfile das escolas de samba daqui 10 anos?

“Tenho um pensamento otimista, porque há dez anos não conseguia prever que o desfile estaria tão bom quanto está hoje. Vivemos um momento muito melhor”.

Como você passou o maior período da pandemia?

“Fiquei quietinho, esperando as coisas melhorarem. Tomei vacina, acredito na ciência e sou um defensor com fé na vida. Foi difícil para todo mundo. O universo das escolas de samba é marcado pela informalidade das questões trabalhistas. Quem trabalha no carnaval e ganhou alguma coisa ou teve assistência foi um sortudo. Foram pouquíssimos.

Como é fazer dois desfiles no mesmo ano e conviver com o favoritismo?

“Maravilhoso. Como um artista que gosta de fazer carnaval diz não para Imperatriz e Império Serrano. Estou cheio de saúde, gás, quero fazer e aceitei. A construção do desfile da Imperatriz foi certamente uma das mais felizes e realizadoras que tive. Foi um ano feliz demais. O Império também está sendo feliz por outros caminhos. Fazer o Império é mais tortuoso do que a Imperatriz, porque é mais complexa e financeiramente mais prejudicada. Não conheço favoritimo antes do desfile. Já experimentei e parei em colocações que não condizem com o carnaval. Só conheço depois do desfile”.

Concorda quando falam que você é o principal carnavalesco do Grupo Especial?

“Os principais carnavalescos do Grupo Especial são Rosa Magalhães e Renato Lage. Disparadamente, eles são os melhores. Isso de ser o principal não passa pela minha cabeça. Minha rotina de trabalho é tão grande e sobra pouco tempo para essas reflexões. Sou muito consumido pelo fazer do meu trabalho. Não acho nem saudável para um artista. A minha cabeça trabalha mais de 20 horas, durmo muito pouco. Chego no barracão às 9h e fico até 22h, de domingo a domingo. A minha equipe todo mundo é braço, só trabalho com braço firme. Gosto de fazer carnaval. Quando perder isso não serei mais carnavalesco. Tenho prazer, gosto da atividade, ser carnavalesco é fazer, realizar, não é desenhar, sonhar. Vivo mais no mundo real do que no sonho. É uma ilusão crer que o carnaval é o mundo do sonho, ele é a vida real. A realidade nua e crua”.

Por que os artistas do carnaval falam pouco sobre arte em geral? O que pensa dos enredos para 2022?

“Há preconceito de fora para dentro e também um silêncio de dentro para fora. Nossa safra de enredos para 2022 é maravilhosa. O dirigente vê números e o artista vê propostas. A fuga de patrocínio do carnaval fez com quem nós tivéssemos uma safra de enredos espetaculares. Alguém ficou mais pobre, mas o carnaval ficou mais rico. Geralmente, quem ficava mais rico, nunca foi quem fez a festa. Pouca gente perdeu e o carnaval ganhou. O momento dos carnavalescos de hoje lembra um pouco do período áureo quando tinha Arlindo, Rosa, João, Renato Lage”.

Entrando no desfile da Mangueira de 2022. Qual é a essência do enredo Cartola, Jamelão e Delegado?

“O que me interessa para o desfile não é a biografia deles, mas o que esses homens são de fato para comunidade que representam. Me interessa muito mais falar que o Cartola era um pedreiro, do que fazer sequência de fantasias das suas músicas. É clara homenagem para eles, em função do exemplo que eles são. Três pretos de excelência, com intimidade com a vida comum de milhares de pretos que podem e devem ser tratados como excelências. São três para representarem três milhões”.

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