InícioRocinhaSérie Barracões: Rocinha promete enredo para exaltar a raça negra

Série Barracões: Rocinha promete enredo para exaltar a raça negra

Por Diogo Cesar Sampaio

Um grito de valorização a raça negra. É esta a mensagem que a Rocinha pretende mostrar em 2019 em sua apresentação na Sapucaí. De volta ao carnaval carioca e de casa nova, o carnavalesco Júnior Pernambucano explora no enredo “Bananas para o Preconceito” a mesma temática que o fez despontar no maior espetáculo da Terra. Em entrevista a reportagem do site CARNAVALESCO, o artista contou como surgiu a ideia do enredo e de que forma pretende desenvolvê-lo.

“O enredo da Rocinha foi uma proposta minha. Surgiu a partir daquele caso de racismo que aconteceu com o jogador brasileiro Daniel Alves. Aquilo ali me causou muita curiosidade em poder desenvolver um enredo desses. E partiu do ponto que já vinha pensando em construir um enredo com essa temática, em alguma escola que eu fosse entrar, ou que eu fosse fazer de um ano para o outro. E acabou que se encaixou super bem com a Rocinha, foi muito bem aprovado pela direção e pelo presidente da escola. Mas já aviso que a Rocinha não vai falar especificamente do preconceito ou fazer referências a casos de violência racial. No nosso desfile, mostramos que todos nós somos iguais. Não há o foco de mostrar o que é um preconceito contra o negro. A gente o valoriza, e não transforma isso em um enredo melancólico e nem sofrido. A Rocinha traz esse enredo para exaltar a raça negra”, explicou.

Para exaltar a figura do negro da melhor maneira possível, Júnior foi a fundo em suas pesquisas para elaboração do enredo. Ele destacou alguns nomes de negros que foram importantes na história, e estarão presentes na avenida em seu desfile.

“O que mais chama minha atenção nesse enredo é a parte do negro, do africano que chega ao Brasil. A gente começa a pesquisar mais um pouco sobre o Dom Obá, sobre a Aqualtune que era avó do Zumbi, sobre o próprio Zumbi dos Palmares… E isso causa bastante curiosidade em ver o quanto que causaram, o quanto que foram importantes para a nossa cultura. E entre outros nomes como artistas brasileiros, escritores, poetas e atores, que com suas histórias e legados fazem com que a gente se empolgue ainda mais em homenageá-los”, contou.

Quando perguntado sobre a sua grande aposta para o desfile, Júnior Pernambucano destacou a abertura e o encerramento do desfile como os grandes trunfos de seu trabalho.

“Eu gosto muito do início da escola. Ele traz certa irreverência, mas ao mesmo tempo, é um dedo na ferida. E tanto o carro abre-alas como as duas primeiras alas, o casal de mestre-sala e porta-bandeira, a comissão de frente, faz essa ligação muito forte. Aposto muito nisso. E destaco também o último setor que traz essa valorização, esse desabrochar do negro da favela. Uma metamorfose do negro que tem toda a ligação com a Rocinha. É algo bonito para se fechar. O início e o fim estão muito bem desenvolvidos e vão ter um efeito muito legal”, antecipou o carnavalesco.

O carnaval da crise

O carnaval de 2019, antes mesmo de acontecer, já vai ficar marcado por ser um dos mais difíceis de toda a história. Independente de grupo, a crise atingiu todas as agremiações da folia. A Série A vive o drama de um corte de 50% na verba do ano anterior, anunciado na reta final dos preparativos. Para piorar, nem mesmo a parcela do valor que as escolas ainda têm por direito foi paga pela prefeitura, mesmo as vésperas para o carnaval. Ao falar sobre o assunto, Júnior confirmou as dificuldades, e admitiu que está sendo o ano mais difícil da sua carreira.

“Esse ano é um ano muito difícil para todas as escolas, tanto para as da Série A, quanto para as do Especial. A crise atacou muito a parte econômica de todas as escolas. Mas, tem solução. Eu que já estou no Acesso há muito tempo, já estou com esse costume de reaproveitar, de utilizar, de usar materiais recicláveis e de outras escolas. A gente já tem esse manejo. Todos os carnavalescos da série A sabem o que eu estou falando. Porém, realmente, esse ano está sendo muito pior. Até porque as escolas estão com as subvenções ainda para sair. A gente está com falta de grana, não está tendo aquele rendimento financeiro que tinha antes, isso faz com que fiquemos mais preocupados com o desenvolvimento e um pouco atrasados. Mas é aquela coisa, tem que ser mágico e sair mudando, transformando uma coisa em outra, para ter como andar com o trabalho e dar desenvolvimento ao carnaval da escola”, desabafou.

E mesmo em meio a toda essa crise, para Júnior Pernambucano, ainda é possível encontrar motivações para continuar, e sentir prazer em trabalhar nos bastidores do espetáculo.

“É possível sim, mesmo com todos os problemas, sentir prazer em fazer carnaval porque existe, até hoje, a essência do samba. As escolas de samba tem isso. E a gente não pode perder esse amor que tem pelo carnaval, pela cultura do samba. Isso sobressai, com toda crise, com tanto sofrimento. No fundo, a paixão grita. É compensador”, declarou.

O artista ainda ressalta que uma boa ferramenta para superar os problemas é a criatividade. Para ele, ela é primordial em qualquer profissão ou atividade, principalmente para carnavalescos.

“Se não tiver criatividade, não é carnavalesco. Tem que ter criatividade, tem que saber desenvolver. E é aí onde está o truque. O cara tem que ser esperto. E isso não é só no acesso não, no Especial também. A pessoa tem que ser criativa, se não for muda de ramo, vai ser cabeleireiro ou outra coisa do tipo. E mesmo assim, para ser cabeleireiro precisa ser criativo. A gente tem que ser criativo em todas as áreas que a gente trabalha. Em tudo, tem que ter um ponto de criatividade, é fundamental”, afirmou.

Júnior também citou que mesmo com todas as adversidades, o acabamento em seus trabalhos é uma coisa que ele não abre mão:

“O acabamento é uma marca que eu sempre busco. A gente tem de ter um bom acabamento independente da pressa, do trabalho ser feito nas carreiras. Tempos sempre que preservar o bom acabamento. E é isso que eu vou levar. Com crise ou sem crise, a gente tem que manter isso. Pode ser a peça mais simples que for, o carro mais simples que for, ele vai estar bem acabado e bem executado”, ponderou.

O fim de uma era e o ano sabático

Em 2013, Júnior Pernambucano estreou no carnaval carioca pelo Império da Tijuca. Com o enredo “Negra, Pérola Mulher”, o até então desconhecido artista sagrou-se campeão da recém-criada Série A, e junto à escola, alcançou a sonhada vaga no Grupo Especial em 2014. No ano seguinte, Júnior continuou na agremiação e assinou o desfile “Batuk”, que apesar de cair nas graças de público e da crítica especializada na época, não conseguiu garantir a permanência da escola na elite.

Depois do descenso e do retorno a Série A, foram mais três trabalhos do carnavalesco pela agremiação do Morro da Formiga. Porém, logo após o carnaval de 2017, chegou ao fim o casamento entre Império da Tijuca e Júnior Pernambucano. Durante a entrevista, ele falou um pouco sobre essa saída.

– Casamento, essa é a palavra certa. Eu e o Império (da Tijuca) fomos um casamento. Tinha ali ligações muito fortes, mas havia a necessidade de dar uma pausa. Já era o momento de eles conviverem com outro carnavalesco, e de eu conviver com outra escola. Havia essa necessidade, por isso que houve a pausa. Mas assim, é claro que um casamento é um relacionamento onde a gente teve grandes frutos, como é o “Batuk” (2014),“Negra, Pérola Mulher” (2013), entre outros carnavais que foram memoráveis e ficaram marcados na história. Não só na minha, como na deles. Da minha parte, posso dizer que existe sim uma admiração, um carinho e respeito pela agremiação, porque foram cinco anos de convívio”, disse Júnior.

Sem contrato com nenhuma agremiação para o carnaval de 2018, Júnior Pernambucano aproveitou para tirar um ano sabático. No entanto, não ficou completamente parado esse tempo, continuando a se dedicar ao carnaval da cidade de Três Rios, onde começou; além de se aventurar pela festa na cidade de Vitória:

“Eu precisava dessa pausa. Eu já via essa necessidade de dar um descanso na minha cabeça, pensar e de ir à busca de uma nova casa. Não fiquei parado totalmente, que eu fiz carnaval em Vitória, no Espírito Santo, e faço carnaval em Três Rios há uns 12 ou 13 anos, que faço em uma escola lá de raiz, onde já estou há um bom tempo. Foi muito bom esse retorno ao carnaval carioca, voltando em uma escola com um nome muito agradável, aceito por todos, que é a Rocinha’.

Júnior Pernambucano se diz bastante adaptável a essas mudanças. Ele ainda explicou que mesmo havendo diferenças no modelo de trabalho ao qual já estava acostumado no Império da Tijuca para o da Rocinha, que já está completamente integrado ao esquema da nova casa.

“Cada escola é uma escola. É igual casa, igual família. Cada família é um sistema. O Império (da Tijuca) tem um sistema de trabalho diferente do da Rocinha. Claro que há um espanto de comportamento em um primeiro momento, que é normal, afinal cada escola reage a uma mesma situação de uma forma diferente. Mas eu sou adaptável. Já me adaptei ao sistema da casa e consegui desenvolver meu trabalho”, garantiu.

No embalo do enredo “Bananas para o Preconceito”, Júnior Pernambucano falou de um dos preconceitos presentes no mundo do carnaval. Segundo ele, os artistas que trabalham e são oriundos da Série A sofrem certa rejeição no Grupo Especial, tanto pelas escolas, como pelos jurados. Com isso, muitos carnavalescos campeões do acesso não ganham nem o direito de subir junto à agremiação, e são trocados na esperança de notas melhores.

“Existem sim preconceitos no carnaval. Como a pessoa não conhecer o trabalho do outro e mesmo assim julgar. Às vezes aposta no nome, aposta em uma referência; mas não aposta na criatividade, não aposta no conteúdo que o artista ou o profissional pode desenvolver. Isso é um certo preconceito. Falando especificamente da minha área, nós carnavalescos que fazemos a Série A, sofremos um determinado preconceito para ir ao Especial, porque se acha que não temos aquela capacidade de ir ou de desenvolver um trabalho a altura. E pode ser que não, pode ser que seja uma grande sacada em dar esse valor e esse certo reconhecimento ao artista da Série A. Esse pequeno preconceito que rola de ‘ele é do acesso’ ou ‘ele nunca fez Especial’, isso para mim é muito chato e não deveria existir. A oportunidade deveria ter para todos, mas agora se o cara não tem a capacidade de aproveitar, aí já é outra história”, comentou.

Entenda o desfile

Terceira escola a desfilar na sexta-feira de carnaval, a Rocinha levará para Sapucaí aproximadamente 1200 componentes. Eles virão distribuídos em 22 alas e 4 carros alegóricos.

Setor 1: “No primeiro setor a gente joga bananas para todos, mostrando que todos nós somos iguais”.

Setor 2: “No segundo setor eu trago uma grande homenagem a esses negros de fora, que são os negros africanos, que trouxeram toda sua cultura para o Brasil”.

Setor 3: “O terceiro setor leva toda a homenagem ao negro da casa, a grande prata da casa, que é o músico, o cantor, o compositor, o artista da televisão, do cinema e do teatro também”.

Setor 4: “O último setor, ele é o setor onde valorizamos o negro da favela, demonstrando a busca do seu trabalho, da sua interação com a comunidade, dá vontade de crescer e desenvolver o trabalho dele. É a vontade de ser reconhecido e de conquistar seu espaço na sociedade”.

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